3.2.09

SEPPIR vai mediar impasse entre comunidades quilombolas e a Alcântara Cyclone Space, no Maranhão

SEPPIR vai mediar impasse entre comunidades quilombolas e a Alcântara Cyclone Space, no Maranhão

28/01/2009 - 16:36

Em reunião realizada na última segunda-feira (26/01), no Ministério Público Federal em São Luis (MA), entre técnicos da SEPPIR e o procurador Alexandre Silva Soares, ficou acertado que a Secretaria vai intermediar o impasse entre os quilombolas e a empresa binacional Alcântara Cyclone Space (ACS/ Brasil-Ucrânia) para a conclusão do Estudo de Impacto Ambiental (EIA) na região de Alcântara. O estudo é uma exigência do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), para o prosseguimento das obras realizadas dentro do limite territorial do Centro de Lançamento de Alcântara.

Por causa do impasse com as comunidades, as obras estão paralisadas desde o dia 28 de dezembro do ano passado, ameaçando o prazo para o lançamento do foguete Cyclone IV, marcado para outubro de 2010. Na semana passada o Ministério Público deu parecer contrário ao pedido de proteção judicial para que a ACS dê continuidade aos estudos ambientais nas comunidades quilombolas de Mamuna, Baracatatiua e Brito. De acordo com o procurador federal Alexandre Soares, que relatou o parecer, o ingresso de pesquisadores nas terras de comunidades tradicionais, sejam índios ou quilombolas, deve ser precedido de diálogo junto aos moradores. Neste sentido, a SEPPIR vai mediar o diálogo entre as comunidades quilombolas e a ACS.

“Vamos esclarecer os quilombolas sobre a importância deste laudo sócio-ambiental que virá, inclusive, a favorecê-los na medida em que servirá de base para a realização de outros projetos sociais para as comunidades de Alcântara. Compreendemos a importância do Programa Espacial Brasileiro e temos o maior interesse em colaborar para que as obras sejam realizadas no prazo, desde que a integridade física e o direito territorial dos quilombolas sejam respeitados”, explicou a diretora de projetos da Subsecretaria de Políticas para Comunidades Tradicionais (SubCom/ SEPPIR), Ivonete Carvalho.

Além da mediação deste impasse, a SEPPIR está encarregada do planejamento, execução e acompanhamento dos investimentos sociais do Governo Federal em Alcântara. A partir da demarcação das terras quilombolas, diversos ministérios poderão executar na região as ações da Agenda Social Quilombola, viabilizando acesso à saúde, educação, construção de moradias, eletrificação, recuperação ambiental, incentivo ao desenvolvimento local, e o pleno atendimento das famílias quilombolas pelos programas sociais, como o Bolsa Família.

Titulação – Em novembro do ano passado, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) publicou Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTDI) que reconhece as comunidades quilombolas situadas no município de Alcântara (MA) e determina a delimitação de suas terras em área total pouco superior a 78 mil hectares.

 A partir da publicação, o INCRA começou a reunir os documentos necessários para a emissão dos títulos de posse coletivos, que deverão ser entregues até março deste ano às 110 comunidades quilombolas da região. Afirma o relatório que “os estudos socioeconômicos, culturais, antropológicos, fundiários, cartográficos e ambientais reconhecem que a citada comunidade se caracteriza como grupo étnico remanescente de quilombo, dotada de trajetória própria e relações territoriais específicas com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida, e concluem que as terras identificadas (...), com área delimitada de 78.105, 3466 ha, são consideradas como território da Comunidade Quilombola de Alcântara.”

Foguetes – O direito de uso da área reconhecida como terra quilombola estava indefinido entre as comunidades quilombolas e a Agência Espacial Brasileira, que pretendia ampliar a área dos sítios para lançamento de foguetes no entorno do Centro de Lançamento de Alcântara (CLA). Reconhecendo o inegável desenvolvimento econômico e científico que será trazido pela ampliação dos sítios, houve um entendimento coordenado a partir da Casa Civil da Presidência da República no sentido de conciliar o Programa Espacial com os direitos das comunidades quilombolas que há séculos ocupam a região. Com isso, ficou definido que os novos sítios serão instalados na área já ocupada pelo CLA. 

Coordenação de Comunicação Social da SEPPIR/ PR

 

Quilombolas retornam à terra, mas continuam sob pressão

03/02/2009

Quilombolas retornam à terra, mas continuam sob pressão

Conciliação permitiu que 31 pessoas da comunidade do Grotão retornassem a uma limitada extensão de terra de 100 hectares. Remanescentes de quilombo têm esperança que demarcação definitiva possa ampliar território tradicional

Por Jane Cavalcante

Araguaína - Depois de ter sido despejada e passar três meses alojados numa quadra esportiva em Filadélfia (TO), a comunidade quilombola do Grotão pôde retornar ao território que ocupam há cerca de 200 anos. O juiz Ricardo Damasceno de Almeida, da Vara Cível da Comarca de Filadélfia, promoveu uma conciliação que permitiu que as 31 pessoas da comunidade - entre elas uma com deficiência física, outra com deficiência mental, além de várias crianças -, retornassem a conviver com os patriarcas Raimundo José de Brito, 69 anos, e Cirilo Araújo de Brito, de 72 anos, os únicos que puderam continuar nas terras localizadas a cerca de 100 km do núcleo urbano de Filadélfia.

A conciliação entre os quilombolas e o casal que pleiteia a posse da área, Marcelo Carvalho da Silva e Daniela Sousa Carvalho da Silva, se deu mediante o processamento de uma demarcação provisória por parte do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), que estabeleceu os limites da área reduzida de 100 hectares destinada à população tradicional.

Com base no acordo firmado em 17 de dezembro de 2008, as famílias teriam apenas 15 dias, a contar da data de encerramento do trabalho dos técnicos do Incra, para refazer os barracos destruídos na violenta ação de despejo e retirar as benfeitorias das terras para além dos 100 hectares demarcados. A demarcação provisória foi concluída no dia 31 de dezembro de 2008, mas a comunidade só conseguiu chegar ao território oito dias depois, num caminhão da prefeitura de Filadélfia. Os pertences dos quilombolas foram levados no mesmo dia por um outro caminhão cedido pelo Incra. Restaram, assim, apenas sete dias para a tarefa de reconstruir e recuperar parte do que eles já haviam plantado. "Não deu tempo para arrancar a mandioca e fazer sete barracos", lamenta Maria Aparecida Gomes Rodrigues, de 30 anos, uma das lideranças do Grotão.

No retorno ao Grotão, quilombolas encontraram cenário de destruição

Não há área fértil dentro dos 100 hectares reservados provisoriamente aos quilombolas. As quatro roças de mandioca do local não foram incluídas na demarcação. Uma delas era comunitária e o prejuízo calculado chega a 250 quartas de farinha, o que equivale a 125 sacos de 60 quilos. Essa quantidade seria suficiente para dois anos de alimentação. Sem contar a interrupção do ciclo normal da agricultura e da produção (preparação do solo, plantio, colheita, torração da farinha, apuração do polvilho e da puba), que constituem a base da subsistência da comunidade.

Para amenizar as perdas, um dos itens do acordo prevê uma indenização por conta da roça comunitária, mas a parte dos recursos que cabe aos pleiteantes das terras (Marcelo Carvalho da Silva e Daniela Sousa Carvalho da Silva) não havia sido cumprida até 16 de janeiro, data final para o cumprimento das determinações do acordo para ambas as partes.

Casas foram queimadas durante ação de despejo da comunidade quilombola.

Os acessos aos riachos, tradicionalmente utilizados para pesca, e às nascentes, fontes de água potável, também ficaram de fora da conciliação judicial. Pelo acordo, os quilombolas estão impedidos de trafegar fora do perímetro delimitado pela demarcação do Incra. O juiz permitiu apenas o tráfego pela estrada que interliga a comunidade ao núcleo urbano de Filadélfia. 

A maioria das antigas moradias foi queimada e destruída na ação truculenta de reintegração de posse. Em cumprimento fiel à determinação judicial, a casa do ancião Cirilo teve que ser derrubada pela própria comunidade. Eles ainda tentaram aproveitar o barro para a construção de novas paredes e se esforçavam para garantir um forno para fazer a farinha.

"Todos os membros da família sempre viveram aqui e ainda estão todos aqui. Desde os mais velhos que já morreram e estão enterrados aqui até os outros, que nasceram aqui também", conta Cirilo. Ao relembrar o momento do despejo, Raimundo Cantuário Camilo dos Reis, esposo de Maria Aparecida, afirma que "foi a única vez que a comunidade se deslocou da região e se ausentou do local em que nasceram, se criaram e viveram até então".

No período em que ficaram na quadra esportiva de 50 m² no centro de Filadélfia, havia apenas uma torneira e, por três dias ininterruptos, faltou água. Mesmo com o retorno ao território tradicional, paira ainda um clima de incerteza, principalmente quanto ao estudo das crianças quilombolas. Segundo Maria Aparecida, as crianças eram muito discriminadas na escola da zona rural e o prefeito de Filadélfia prometeu arrumar transporte para que elas possam estudar num povoado mais próximo. A promessa, contudo, ainda não se concretizou.

Grupo de 31 pessoas vive "confinado" numa área de cerca de 100 hectares.
Pesquisa antropológica da Universidade Católica Dom Orione estima que a comunidade quilombola do Grotão habita a região há aproximadamente 200 anos. Esse estudo, porém, não foi levado em consideração no acordo judicial. Para casos de comunidades remanescentes de quilombo, é preciso que haja um estudo elaborado por um profissional credenciado pelo Incra.

A comunidade aguarda, portanto, que o Incra redefina os marcos da demarcação (para além dos 100 hectares provisórios) quando do trabalho de caráter mais definitivo. "O antropólogo do Incra já nos comunicou que estará vindo até o final deste mês de janeiro para fazer o estudo oficial e, com base no mesmo, fazer a demarcação definitiva", conta Pedro Ribeiro, da Comissão Pastoral da Terra (CPT) de Araguaína (TO), que vem acompanhando o caso.

"Confiamos que tudo vai melhorar depois da medição e do estudo do antropólogo. Nós tomamos grande prejuízo: nossas criações domésticas acabaram. Fiquei muito abalada com essa saída, mas estamos felizes por ter voltado e temos esperança de que tudo se resolva e que futuramente temos a esperança de conseguir todo nosso território de volta", diz Aparecida.

Notícia relacionada:
Quilombolas estão alojados há um mês em quadra esportiva


Fonte:
http://www.reporterbrasil.com..br/exibe.php?id=1491